Segundo a tradição, um dos maiores filósofos foi Sócrates, embora
nada tenha escrito e quase tudo que conhecemos acerca de seu trabalho
fora escrito por seu discípulo Platão. Os últimos momentos da vida
de seu mestre encontra-se narrado no diálogo de “Fédon” ou “Da
Imortalidade da Alma”. Sócrates corajosamente aceita a sentença
que seus pares lhe impuseram, negando-se a fugir como propunha seus
discípulos, pois para Sócrates, obedecer as leis da cidade era uma
questão de honra. Devemos nos lembrar que Sócrates também era
político, uma espécie de deputado ou senador de Atenas.
Aceitando
sua sentença de morte, Sócrates dá sua última “aula” aos
discípulos, revelando o caráter moral de sua decisão, de coerência
com o que havia dito e vivido como cidadão ateniense. Fala das
virtudes (temperança, coragem, justiça) e convida seus discípulos
a serem fiéis aos apelos de suas consciências, mesmo enfrentando
tamanha injustiça. Diz Sócrates: “Se morrer é encontrar-se com
os grandes da história de Atenas (como Péricles, pai da
democracia), a morte então seria um prêmio para ele”.
Impressionado com a vida e também com a morte de seu mestre, Platão
revelará em praticamente todos os diálogos que escreveu, como
no “A defesa de Sócrates”, o quanto seus ensinamentos e
coerência de vida eram fundamentais para construção de uma
sociedade justa e de uma vida feliz.
Podemos
também falar de Epicuro, nascido na cidade de Samos, tornou-se
discípulo de Demócrito com apenas quatorze anos de idade. Depois de
muitas idas e vindas, instala-se em Atenas onde funda sua escola
filosófica para homens e mulheres, que, como não podia deixar de
ser, foi alvo de fofocas escandalosas. Epicurismo ou Hedonismo, tem
como princípio de sua doutrina, pregar que a felicidade humana deve
se basear na vivência do prazer, o que não significa desregramento
ou, imoralidade. Para ele, o prazer devia ser regido pela razão,
pelo equilíbrio, ou seja, a justa medida de Aristóteles.
Epicuro
ensina seus discípulos a não temer a morte, pois pior seria viver
para sempre e pior, viver em desgraça, miséria ou dor. Antecipar o
pensamento de morte não vale a pena, pois o morrer, em si, não faz
parte da vida. Será apenas um momento que, de repente nos conduzirá
para outros horizontes ou para o nada. Assim como dormimos todas as
noites e não percebemos como isso acontece, assim será a morte.
Portanto, o que vale na vida de verdade, é procurar viver bem,
desfrutar o que há de bom, viver intensamente cada instante, e estar
com os amigos.
Também
Martin Heidegger, filósofo alemão, e um dos principais pensadores
do século vinte, que escreveu obras como “O ser e o Tempo”, é
tido como um pensador Existencialista (embora não tenha aceitado o
adjetivo). Mas, ao se preocupar com um sentido mais profundo para a
existência humana, ou com a questão metafísica do “ser aí”, e
ao afirmar que “o homem é um ser para a morte”, Heidegger
certamente se inscreve entre aqueles que tiveram uma preocupação
comum, aos filósofos denominados existencialista, como Sartre.
O
ser humano vive sua existência como projeto, com suas infinitas
possibilidades de realização no futuro, mas somente uma poderá ser
sua escolha, que nunca é definitiva. A todo momento a liberdade
humana é chamada a se posicionar, a se ajustar, mas sabendo que a
própria liberdade não é um dado pronto e acabado. A liberdade se
faz a cada momento que se coloca, a cada ato, livre ou não. Todavia
o homem sabe que há uma “situação-limite” colocada pela morte.
E este é um fato do qual homem algum poderá escapar, fazendo surgir
assim a angústia existencial e as tantas perguntas sobre o sentido
de nossa existência.
“Por
que, e para que viver, se tudo acabará com a morte?” Quem nunca se
fez esta pergunta? Devemos nos lembrar que para Heidegger, não
podemos contar com a saída da crença em vida eterna, ou seja,
imortalidade da alma, possibilidade dado pelos filósofos metafísicos
tradicionais como Platão, Descartes, ou Leibniz.
Diante
da angústia perante a desagradabilíssima e inevitável experiência
da morte, o que não significa medo psicológico, depressão ou
pensamento mórbido sobre a morte, temos duas saídas apenas: Uma
existência autêntica dos que assumem essa angústia e
aceitam sua finitude, voltando-se para um viver crítico, responsável
e quem sabe livre. Se esta é a única vida que tenho, cabe somente a
mim vivê-la em plenitude, a construí-la com os outros no mundo, sem
medo, sem amarras, sem escravidão e mesquinharias.
A
outra posição que um ser humano pode tomar diante dos pensamentos
aterradores acerca de sua morte é o do homem inautêntico,
que foge da angústia da morte, que nega a sua realidade por meio de
mil subterfúgios, refugiando-se na impessoalidade, alienação
religiosa e massificação. E por negar a angústia da morte, acaba
por negar-se a si mesmo e a autenticidade de sua vida.
Mas
e os que ficam? Deixemos de lado um pouco os Filósofos, e falemos
dos psicólogos que buscam uma explicação e até uma sistematização
do luto para quem perde um ente querido. Os psicólogos, observam, na
clínica, o aumento do volume dessa demanda significativa no
vivenciar e expressar essa dor, e que experimenta sensações e
emoções até então desconhecidas e inconcebíveis.
Para
quem fica, o que lhe resta é conviver com a “presença da
ausência” e cada um lidará de uma maneira diferente com este
sentimento. Não é uma dor física, produzida pela estimulação de
terminações nervosas específicas em sua recepção, mas a dor com
sentido, com razão de ser e significados muito subjetivos, com
sentimento de pesar, de aflição. Alguns primeiramente NEGARÃO a
existência desta dor. Criarão estratagemas para lidar com ela,
fingirão que não aconteceu, inventarão situações que
proporcionem certa alienação da realidade da perda e geralmente não
quererão falar sobre o assunto.
Então
surge a RAIVA, a indignação, os questionamentos do “por quê
comigo?”, o que eu fiz para merecer isso?”. Revoltar-se-á com
Deus, com os outros e até consigo. Alguém é o culpado e precisa
ser punido. Vai tentar BARGANHAR na sequência. Dirá certamente que
“há males que vem para o bem”, que “o que não me mata me
deixa mais forte” e nesta negociação consigo mesmo, dirá que se
sair desta situação será uma pessoa melhor, amará mais, ouvirá
mais, perdoará mais, acertará mais, e se importará menos com
problemas pequenos.
Até
aqui tudo parece bem, mas então vem a DEPRESSÃO. É agora que a
pessoa se afasta para um mundo que é só seu, acaba por isolar-se
dos demais, inclusive das pessoas que lhe querem ajudar. Mergulha na
melancolia e definitivamente se vê totalmente impotente para lutar
com esta dor. Agora arrasada, se entristece muito mais do que
outrora. O mundo fica cinza, as flores perdem as cores, o canto dos
pássaros não agradam mais, pelo contrário, a felicidade impressa
no canto deles chega a incomodar, assim como a felicidade de qualquer
outro ser. A raiva retorna, aliás, não há uma sequência lógica
para esses sentimentos, hora aparece um, hora surgirá outro. A mente
da pessoa mais parece um barril de pólvora prestes a explodir à
menor faísca.
“Não
há mal que dure cem anos”, já disse alguém não sei quem e não
sei quando. Alguns...alguns
repito, ACEITARÃO. Se a pessoa conseguiu vislumbrar uma luz no fim
do túnel, e bravamente superou as fases mais atrozes de uma perda,
ou de um luto mais especificamente, finalmente ela estará pronta
para prosseguir sua vida. Não há mais desespero, não há mais
raiva nem negação ou depressão, a dor agora já é quase
imperceptível. Restou apenas uma saudade. O cheiro da pessoa que se
foi, ficará em outras pessoas com as quais consequentemente cruzará
na rua. Se não se desfez dos objetos do que se foi, as roupas ainda
penduradas nos cabides trarão boas lembranças. Uma comida que ela
gostava, uma canção que lembrará uma dança que aconteceu, e
possivelmente lágrimas brotarão, e serão pesadas, difíceis de
segurar, mas não serão lágrimas desesperadas, não serão lágrimas
de dor, e sim de alegria. Alegria por poderem ter convivido com
alguém tão especial.
Continua...
Edson
Moura.
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