sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Do que somos feitos?


Não sei porque, mas tenho a sensação de que a “matéria prima” da qual somos feitos, – seja por Deus ou mero Acidente – é feita, basicamente de falta, tédio, angústia, solidão, com algumas “pitadas” de medo.
Falta: a psicanálise (principalmente em Freud e Lacan) nos descreve como seres “faltantes”, que desejamos porque nos falta alguma coisa. Mas a verdade é que sempre nos falta alguma coisa. Mesmo que tenhamos muitas coisas, sempre falta algo a mais.
Tenho o pressentimento, de que a “falta” encontra-se alojada dentro de nós, como um verdadeiro parasita, que mesmo quando é alimentado, sempre volta a sentir “fome” - esta “fome” é a falta, ou seja, a falta não é de um objeto específico, mas fala de algo em nós: somos seres desejantes porque somos seres faltantes.
Tédio: é o famoso “trio” denunciado já algum tempo, pelo filósofo Schopenhauer: desejo aquilo que me falta, mas quando sacio o desejo, me satisfazendo com o objeto faltante, me vem de imediato o tédio.
O que mais próximo chegou, a meu ver, de descrever a sensação do tédio, foi o sábio do livro de Eclesiastes, quando diz que “vaidade por vaidade, tudo é vaidade”, palavra esta, que traduzida no latim significa “nuvem de vazio”, ou seja, tédio é o satisfazer um desejo de uma falta, descobrindo que não passava de uma mera “nuvem de vazio”.
(Não importa o que façamos, tudo é pura "vaidade": "nuvem de vazio". Estamos condenados a rastejar pelo resto da nossas vidas, em vão, a procura de preenchimento permanente, pois tudo que usamos para nos encher, logo se esvazia, dando lugar ao vazio).
Angústia: Kierkeegaard e Pascal (ambos filósofos cristãos, e dos grandes) denunciaram a angústia como condição humana inexorável: se somos seres faltantes, que por ter a falta, desejamos, que ao satisfazer o desejo caímos diante do tédio indiferente a nós, se tudo é "vaidade", logo, nos angustiamos, dai, não escaparmos de nossa condição. Para além de qualquer escolha, de qualquer vida “boa” possível, somos seres angustiados.
(Angustiados, pois nunca conseguimos satisfazer; por sabermos que somos seres finitos; por termos que arrancar sentidos, a força, das coisas; porque temos que sempre fazer escolhas; porque somos atormentados por nossas misérias, desejos, obsessões e traumas; enfim, porque somos humanos).
Solidão: nossa vida apesar (ou por) ser uma vida social, podemos e sentimos, às vezes, só, em meio a toda gente, porque nossa vida é uma trajetória em meio ao deserto: vivemos muita coisa sozinhos, não conseguimos partilhar tudo de nós e de dentro de nós com o outro, por mais que o outro se disponha a nos entender, seremos entendidos com o entendimento do outro, com a sensações do outro, que por ser outro não pode ser nós mesmos.
Finalmente, medo: ora, se somos tudo isso, se vivemos tudo isso, se não podemos escapar de nada disso, segue-se o medo da própria existência, que tem como “cereja” em cima do “bolo”, ou seja, por mais que queremos fugir, refugiar em alguma coisa, em algum lugar, não há uma salvação definitiva e absoluta.
Por isso (tudo) que a visão de mundo que melhor nos descreve, é, de longe, a visão trágica dos gregos. Assim, quando estou diante de qualquer pessoa, sei que estou diante de alguém que mais cedo ou mais tarde foi, é, e será esmagado, engolido vivo, pelo absurdo da vida.
No fim, tenho que concordar (novamente) com os gregos, de que a maior virtude que podemos ter é a coragem.
Coragem de lutar; de insistir em viver; de continuar caminhando - mesmo em direção a própria morte, porque viver é isto: cada passo vivido é um passo em direção a morte. Portanto, meu respeito e admiração para com o animal humano - eu, você, e todo o restante da humanidade, demasiados humanos.

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